quarta-feira, 30 de junho de 2010

OS GATOS

São belos os gatos
Pequenos, grandes, gordos e magros
Pretos, brancos, mariscos e pintados
Subindo e descendo dos telhados
São belos os gatos

Angorá, persa, siamês
Vira-lata, chinês, burguês
Os olhos e toda tez
Castanho, verde, azul, imaginem vocês!
Lindos como bebês

Olhar sedutor e misterioso
Vontade própria, genioso
Se cruza a estrada, supersticioso
Sociável, amigável, amoroso
Apela por um carinho gostoso

Os gatos são especiais
Assim como os cães, também são leais
Só não são submissos, jamais!
São inteligentes, atraentes, fatais
Assim são os gatos e nada mais

Em 05/12/2003
Serrolândia - BA

segunda-feira, 28 de junho de 2010

PRIVADA DA IGNORÂNCIA

Tem gente que pensa
Que prato é penico
É... penico
Dão a mesma função
Aos dois objetos
Sabe aquele ditado:
"Cuspiu no prato que comeu?"
Pois é... fazem isso mesmo
Confundem o público e o privado
Ou melhor dizendo: privada
Privada da ignorância
De jogar lixo na rua
De mijar encostado no muro
De pichar a parede alheia
Em busca de aventura
De depredar o patrimônio público
Dizendo que é do governo
Burlar as leis achando que é inteligente
Essa gente, e como tem gente!
Não passa de idiotas
Que reproduzem exatamente
O que as elites querem
Gente burra, mal educada
Que dependem eternamente
Da "sabedoria" e intelectualidade
Deles, que são minoria
Gente que não sabe o poder que tem
Não usa a força que possui
O que você prefere:
Lutar contra tudo isso ou
Continuar cagando e comendo
No mesmo prato?

Em 16/05/2003
Serrolândia - BA

quarta-feira, 23 de junho de 2010

DERIVA

Estamos à deriva
Neste mar de ilusão
Sem porto
Nem cais
Sem farol
E direção
Seguimos sem rumo
Para qualquer lugar
Sem chão
Sem timão
Nem como parar
Viagem, mistério
Trilhos fatais
Caminhos cruzados
Vidas desiguais

Em 22/12/2003
Serrolândia - BA

terça-feira, 22 de junho de 2010

CAMINHANDO

Encontro sempre a saída
Para as minhas doces feridas
Nos tropeços da trajetória
No percalço e na vitória
Pela cadência da vida

Busco a tinta improvável
Pra tingir o insuportável
Com pigmentos de saudade
A efêmera eternidade
Numa plêiade incansável

Sou encontro com ninguém
Transitando no além
Com linhas da curta existência
Consturo os retalhos de toda ausência
Tristes farpas do alguém

Viajo nos trilhos da loucura
Embriagado de amargura
Conto o tempo do acaso
Adiantado relógio do atraso
Como azedume e doçura

Em 28/04/2007
Serrolândia - BA

segunda-feira, 21 de junho de 2010

VENENO BRANCO

Serenos campos
Brandos e abertos
Sonhos encarnados
Vento sussurrante
A bailar

Moreno canto
Quando incerto
Risonho escancarado
Alento inebriante
Ao luar

Pequeno antro
Manto encoberto
Tristonho embaçado
Atento estonteante
A cantar

Veneno branco
Meandro colérico
Demônio cansado
Invento mirabolante
No ar

Em 04/08/2005
Serrolândia - BA

sexta-feira, 18 de junho de 2010

LUTO

"Um Amador Poético" não poderia deixar de prestar
uma homenagem a um dos maiores escritores da
literatura mundial. Hoje perdemos José Saramago.
Suas obras e sua memória perdurarão por muitas
gerações, pela solidez do seu pensamento, pela
originalidade de suas ideias.

RODA DAS FLORES

Roda, gira
A vida roda
Gira vida
Viva rosa
Sempre-viva
Margarida

Giral o sol
Sol gira
Branca vida
Ida e vinda
Girassol

Gira o tempo
Vira as horas
Hora viva
Roda viva
Onze-horas

Tempo roda
Tempo tanto
Vira e roda
Flor-do-campo

Roda o tempo
Curto tempo
Tempo encurta
Tanto tempo
Linda murta

Furtacor
Gira e furta
Jaz em mim
Furta e roda
Vida curta
O jasmim

Vem de mim
Vem e roda
Roda o tempo
Tempo escravo
Vida viva
Vira o tempo
Doce cravo

Tanto conta
Conta e gira
Vira e rir
Rir e roda
Furta e vira
Flor-de-lis

Vai rodando
Roda e vai
Vai e passa
Flor em flor
Beija e gira
Gira e roda
Roda e vai
Beija-flor

Voa e vai
Vai e gira
Gira e exala
Seu olor
Perfumada
Linda flor

Para todas as flores, vegetais e humanas,
que tornam este mundo mais perfumado.

Em 15/04/2003
Boa Vista do Tupim - BA

quinta-feira, 17 de junho de 2010

LETRAS CADENTES

As letras caem
Não vejo de onde
Mas as letras caem
De todos os lados e cantos
Do céu, do telhado
Da árvore, do livro que se abre
Caem descompassadamente
Pulam, engatinham
Juntam-se
E formam palavras
Código de coisas que conheço
Interpreto e pronuncio
As letras continuam caindo
Nos altos e baixos planos
Que posso imaginar
No colorido das orações
Que já posso formar
No mar de coisas belas
Onde quero navegar
Leio, leio, leio...
Decompassadamente, leio
Interpreto, imagino, crio
E recrio o inimaginável
Cato as letras no ar
Quantas posso reunir
De várias cores, tamanhos e estilos
Maiúsculas e minúsculas
Vogais e consoantes
Transporto os meus sentidos
Ignoro tudo ao meu redor
Quero cada vez mais letras
Mais palavras, mais orações
Mais textos
Sou um escritor
Das vastas ilusões do inconsciente
Sou um leitor
Das várias sensações inconsequentes
Mas antes de tudo
Sou um catador de letras cadentes

Em 06/04/2003
Boa Vista do Tupim - BA

quarta-feira, 16 de junho de 2010

CANIVETE DO TEMPO

Arrebato o canivete do tempo
E risco a pele com destreza
Marcas contínuas, mas firmes
O sangue escorre
Por entre os poros
Cintilam sob os raios do sol
Descem lentamente
Marcando seu caminho
Fazendo desenhos sinuosos
Como se quisessem ser serpentes
Tortuosidades que exprimem o real
Marcas dos vultos do inconsciente
Congelam-se, coagulam e mudam
De cor, de tom, de forma
O sangue escorrido
Agora estancado e tiso
Imóvel e corpuscular
O canivete do tempo
Já não é mais
Já não faz mais sentido
Os vincos por ele deixados
Cicatrizarão
Marcarão seu caminho
Mas irão se fechar
O tempo é mestre e perdição
É do homem o ponto de partida
O meio e o fim
Rasgar esse cordão, lascerar
Interromper a sequência do movimento
E mudar o curso do destino
Cortar à canivete
Do tempo
Do modo de ver o infinito
O homem é
Por ele mesmo
O próprio canivete
Do tempo

Em 18/12/2005
Serrolândia - BA

terça-feira, 15 de junho de 2010

CATACRESIANDO

Lua-de-mel
Qual zangão bravo
Que voou tão longe
Para te transformar em favo?
Quem foi o engraçadinho
Que, metido a pintor
A barata envernizou?
E resolveu deixar
Os dias cinzentos sem cor?
O espertalhão que tingiu
A abóbora de laranja?
E disse que a encosta tem franja?
Obturou o dente da faca
Afirmou pro pato que
O cavalo tem quatro patas?
Que descobriu as pernas da mesa
Exibindo-as com destreza?
Puxou a orelha do livro?
Colocou óculos de grau
No olho do furacão?
Tampou a boca da noite
Com total precisão?
Comprou um chinelo
Para o pé-de-moleque
Uma luva de pelica
Para a mão do pilão?
E um piercing transado
Pro nariz do avião?
Vestiu meia-calça
Na colcha de retalhos
Terno e gravata
No triste espantalho
Botou peruca loura
Na cabeça do prego
E colírio de pimenta
No olho do cego
Passou batom rosa-choque
Na boca da garrafa
Envenenou as maças do rosto
Com doses de cachaça
Depois fugiu...
Voou pro céu da boca
Foi engolido pela boca do estômago
E sumiu!

Em 03/06/2005
Serrolândia - BA

segunda-feira, 14 de junho de 2010

SONHO DE PENSAMENTO

Nas vastas amplidões dos serenos campos
Corri além dos vales amarelos
Transportando nos mais altos crepúsculos
As noites com que sonhava
A grama encarnada coberta de orvalho
Parecia estender-se como tapetes de algas
Murchas na maciês das colinas
A brisa gélida de quase junho
Transgredia a ponta do meu nariz
Como um toque sutil e ávido
Folhas secas voavam
E dividiam o céu alaranjado
Com pássaros cinzentos
Burlando o colorido som do vento
Que movia os galhos dos arbustos
Tudo era tão simples...
O cheiro da água cristalina
O jorro do pequeno córrego
Dobrava e erodia vagarosamente
As pedras que ali estavam depositadas
O tudo e o todo era sublime
Cobras e lagartos
Desenhavam estranhas figuras
Na areia pálida do descampado
Vagarosamente
Extremamente lento
O sol despontava como rei supremo
As cores do prisma
Delineavam ainda mais a paisagem:
Amarelo, ciano e magenta
E o sonho mudou de cor

Em 11/04/2003
Boa Vista do Tupim - BA

domingo, 13 de junho de 2010

FÍSICA GEOGRAFIA

Curva do sol atraente
Talvegue nos vales profundos
Ternura dos trópicos ardentes
Lugares de mundo,  no mundo

Grandes escarpas escuras
Paredes, douradas falésias
Traços, rabiscos, hachuras
Sombras da geodésia

Sulcos de planos terrenos
Cadeias de altas montanhas
Estreito de golfos pequenos

Distantes meridianos paralelos
De uma física geografia
Severos mapas amarelos

Em 11/04/2003
Boa Vista do Tupim - BA

quinta-feira, 10 de junho de 2010

DANÇA DAS BORBOLETAS

Abram as portas
Escancarem as janelas
Deixa entrar em minha casa
Na sua casa
Borboletas amarelas

Brilhantes, coloridas
Florescentes com a luz
Invadem toda a sala
As borboletas azuis

Tragam sonhos
Espalhem vida sob as telhas
Batam asas, batam asas
Borboletas vermelhas

Tragam esperança
Cheguem cedo ou tarde
Pelas frestas e cantinhos
Surgem borboletas verdes

Rasguem o céu
Derramem qual tinta de caneta
É o mistério e a beleza
Das borboletas pretas

Invadam os quartos
Com som, poesia e prosa
Encantem de desencantem
As borboletas rosas

Minha casa está aberta
Soem guizos e trombetas
Que se abra hoje e sempre
Para a dança das borboletas.

Em 29/05/2005
Serrolândia - BA

quarta-feira, 9 de junho de 2010

NENHUM LUGAR

Nenhum lugar existe
Confusa sincronia de ideias
Falsas relações quotidianas
de lugar para lugar
Longe ou perto
O fluxo comemora
Comemora o alvorecer
De mais um dia de solidão
No qual todos os demais
São meros expectadores de si mesmos
E o que é o ser, o existir?
Dramática concessão dos fatos
Invenção de realidades
Para outra realidade:
Nuvem, vento, água, sol
Passam e transformam
Revisitam e deformam
Imaginar e buscar
Entender e deduzir
Que nenhum lugar existe

Em 11/04/2003
Boa Vista do Tupim - BA

terça-feira, 8 de junho de 2010

ME LEVA POESIA!

Me leva poesia!
Me leva pra longe daqui
Me faz imaginar
Sonhar, sorrir

Quero sentir a brisa suave
Voar no mais alto céu
Pousar no canto dos pássaros
E banhar-me em rios de mel

Desprender-me de um corpo insano
Ser luz no fundo do espírito
Criar as coisas mais absurdas
Tonar o limitado, infinito

Cantar o meu silêncio
Me leva poesia!
Deixa-me ser livre
Transitar na fantasia

Muda-me a cada momento
A cada instante, uma alegria
A cada tristeza, um desafio
Me leva poesia!

Em 01/12/2003
Serrolândia - BA

segunda-feira, 7 de junho de 2010

FUGA

Verniz de sangue
Que cobre o dia cinzento
Calor sufocante
Vida e desalento

Tintura mórbida
Sem cor e sem vida
Palavra sórdida
Coisa esquecida

Face sem expressão
Olhar opaco
Mar de escuridão
O toque sem tato

Boa Vista do Tupim, julho de 2001

sábado, 5 de junho de 2010

ERA UMA ÁRVORE

Era uma árvore grande e robusta
As raízes fincavam com firmeza
Seus grossos troncos não chão
A copa ocupava
Um vasto diâmetro ao seu redor
Nos ocos de seu caule
Viviam muitos insetos e roedores
Em seus galhos
Vários pássaros construíram ninhos
(inclusive o joão-de-barro)
As flores que dos ramos brotavam
Perfumavam tudo por perto
Os frutos saborosos
Alimentavam imensidades de animais
Grandes e pequenos
Abrigavam-se na sua sombra refrescante
Suas folhas, ao caírem
Adubavam a terra num ciclo initerrupto
À noite,
O vento balançava a gigantesca e velha árvore
Numa dança mágica de movimentos e sons
Mas um dia
A árvore suncumbiu em segundos
Ao poder destruidor e estúpido da serra-elétrica
O que era belo
Resumiu-se a galhos secos retorcidos
E lenha.


Em 11/04/2003
Boa Vista do Tupim - BA

sexta-feira, 4 de junho de 2010

PEIXINHO DE AQUÁRIO

Como é triste ver
Coitados! Coitadinhos!
Disolados e solitários
Nos aquários, os peixinhos

O espaço é minúsculo
E põe minúsculo nisso
Com pedrinhas prateadas
Menor que concha de marisco

Vermelho e azul
São as cores dos priscioneiros
Chamam-se Atlas e Netuno
Deuses gregos em viveiros

Não bastasse tamanha humilhação
Com tão pouco espaço nessa vida
Ainda mendigam todo dia
Cinco bolinhas de comida

Nadam de um lado para o outro
Sonhando com rios de muita água
Nadam tanto, se cansam e param
E afogam suas mágoas

Esta vida não é fácil
Nem é palácio nem é templário
Mas o pior de tudo isso
É ser peixinho de aquário

Em 27/07/2002 às 00h20
Boa Vista do Tupim - BA

quinta-feira, 3 de junho de 2010

DESEJO

Desejo estar contigo agora
Sentir-me entre teus braços
Dormir e perder as horas
Ocupar os seus espaços

Eternizar todos os momentos
Lutar contra a solidão
Extrapolar o meu sentimento
Escancarar o fogo do coração

Quero você, agora e pra longevidade
Me perder de tanto amor
Romper as barreiras pra felicidade
Na chama ardente do teu calor

Quero músicas apaixonadas
Temas que falem de nós
E nossas pernas entrelaçadas
Como a agilidade do algoz

Tua voz sussurando no meu ouvido
Rouca e ofegante
Arrepia-me todos os sentidos
Estasiados amantes

Em 23/08/2004
Serrolândia - BA

EM BUSCA DE QUE?

Espio tudo ao meu redor
Olho, olho, olho...
Haveria uma luz no fim do túnel?
Se há, não enxergo
Paro. Penso
Sigo minha caminhada
Sei que devo seguir
Seguir em frente
De imediato pode não haver resposta
Mas depois, sim
Quero lutar, conseguir o que quero
Irei descobrir
Subirei... até o mais alto ponto do planeta
Espiarei novamente
Descobrirei que estou só
Paro, penso, percebo
O homem não vive só
Achei que estaria em evidência
Maior que todo mundo
De fato estava. Mas quem me viu?
Como pude compatilhar a minha alegria?
Vi... lá embaixo, o sentido da minha vida
Desci... olhei para as pessoas que passavam
Minha face se encheu de alegria
Quis gritar, pular, correr...
Naquele momento queria falar com todos
Sabia que minha busca tinha chegado ao fim
Aliás,
Estava tão perto de mim e eu não via
Estava cego. Só. Mal. Infeliz
Não queria ver que a solução para o meu problema
Era eu mesmo
Não percebia que o homem,
Eu, um homem
E como todos os homens
Não poderia viver isolado no meu mundo
Longe dos homens
Sou um ser
Um ser homem
Eu sou você
Um ser eu
Eu sou você
Você e eu
Seres sociais

Em 05/05/2002
Boa Vista do Tupim - BA

quarta-feira, 2 de junho de 2010

PÁSSARO, PÁSSAROS

Pássaro, pássaros
Coloridos e cantantes
Entre galhos
Entre tantos
Migram viajantes

Pintassilgos, rouxinois
Coleiros, rolinhas
Papas-capim
Bens-te-vi e curiós

Periquito, azulão
Inhabu, garrincha
Pássaro-preto
João-de-barro e cancão

Carcará, anum
Arararinha, bigode
Beija-flor
Pardal e assum

Acauã, carrega-madeira
Papagaio, patativa
Quero-quero
Sofrê e lavandeira

Xexéu, gavião
Canário, colibri
Galo-da-serra
Sanhaço e currupião

Pássaro, pássaros
Sem cores, mudos
Entre grades
Entre poucos
Presos no absurdo!

Em 02/06/2010 às 11h10
Quixabeira - BA